Foto: Taís Peyneau / Agência Petrobras
Nessa semana mais uma alta no preço da gasolina, diesel e GLP nas refinarias. O litro da gasolina já está acima de R$ 6,00 em Porto Alegre e em alguns casos atingindo a marca de R$ 6,19. A Petrobras reajustou oito vezes os combustíveis no primeiro semestre de 2021. Esses aumentos impactam direta ou indiretamente em praticamente todos os segmentos da economia, pois são a principal fonte de energia no transporte de mercadorias e de pessoas, além do preparo diário das refeições – contribuindo significativamente no descontrole da inflação.
Mas por que o preço dos derivados varia tão acima da inflação? O que está por trás do aumento dos preços dos combustíveis?
Arte: Dieese
Arte: Dieese
Isso significa que o custo de importação está sendo incluído nos cálculos, fazendo com que cada um dos derivados nacionais tenha seus valores equiparados ao de importadores, ou seja, a Petrobras pode aplicar preços mais baixos, que, consequentemente, forçariam a concorrência a fazer o mesmo, porém está acontecendo o inverso: ela aumenta o preço para se igualar aos concorrentes.
Essa prática é a que especialistas chamam de dolarização do combustível. Fazendo um paralelo: alimentos também estão mais caros devido à apreciação do dólar. O câmbio desvalorizado torna mais atrativo ao produtor nacional exportar do que vender para o mercado interno.
Na Petrobras é diferente. Evidentemente que existem muitos insumos em dólar (elementos da cadeia produtiva importados), mas isso está adequadamente registrado nas planilhas de custo e possuem uma participação “x” na constituição do preço de cada derivado.
O que está encarecendo e promovendo essa oscilação é essa política de PPI – qualquer movimento, para cima ou para baixo, nos custos internacionais do petróleo ou no câmbio, corresponde a reajustes na mesma direção nos preços praticados nas refinarias da empresa, repercutindo na cadeia de distribuição até chegar ao consumidor final.
É uma política absurda que visa conceder espaço de mercado a concorrentes, segurança a esses entrantes, proteção aos importadores de derivados (com destaque para a Shell e a Mubala), gerar dividendos para acionistas minoritários e facilitar o processo de privatização. E vale destacar que se ocorre uma grande privatização (como a que está em curso), as possibilidades de aumentos ainda mais abusivos são reais e, pior, se o governo percebe que precisa regular de alguma forma, corre-se o risco de ter a produção direcionada para a exportação e, portanto, podendo refletir, inclusive, em desabastecimento.
No mundo, em torno de 80% dos países adotam uma política de PPI, mas fazem isso porque não têm produção e nem refino de petróleo. No Brasil, com o pré-sal, nos tornamos autossuficientes na produção de petróleo, com custo relativamente mais baixo em comparações internacionais, além do que, de acordo com especialistas, há capacidade ociosa. Se o petróleo é do Brasil, por que o preço é importado?
Liberais defendem essa ideia, que o governo federal (acionista controlador) não deve intervir nesta política de preços, deve seguir mantendo a paridade, pois o que importa é o maior retorno financeiro possível para a Petrobras e acionistas da empresa.
Essa lógica sempre imputou a necessidade de novos entrantes – sob o argumento de que abrir o mercado e ter concorrência reduziria o preço. Empresas privadas argumentavam que não investiam no segmento, no Brasil, porque não tinham como concorrer com a Petrobras.
Nesse aspecto, não há como não se perguntar: o monopólio estatal do petróleo foi quebrado em 1997, desde então qual foi a petrolífera estrangeira que fez investimentos no Brasil a ponto de construir refinarias do porte da Petrobras? Ou que tenha realizado investimentos para descobrir campos de petróleo – projetos que requerem grandes investimentos e que demandam longo prazo para maturação?
Não existe, pois são abutres: o interesse é comprar a preços insignificantes o que já está instalado e obter os lucros com o menor risco possível. A política do PPI é perfeita para esse propósito.
Outro fator que deve ser lembrado é o da redução do preço na refinaria. Redução essa que não chega ao consumidor. Esse repasse não ocorre por um motivo simples: aumento dos lucros.
Importadores aumentam as margens de lucro do mercado de distribuição e/ou margens de lucro do mercado de revenda – já que em muitas regiões do país os postos são cartelizados.
Esses agentes acabam também represando devido a imprevisibilidade do setor, inerente, em parte, da própria PPI. Um mecanismo que contribui na inibição desse problema, seria justamente manter uma distribuidora estatal como era a BR Distribuidora, – que foi 100% privatizada no último dia 30 de junho, ela poderia reduzir o preço estimulando a concorrência a acompanhar. Esse é mais um aspecto do preço dos combustíveis que deixa a sociedade à mercê de agentes privados que visam o lucro.
De outro lado, há quem defenda uma política de preços pautada na defesa da população, levando em conta, além do preço do barril e variação da taxa de câmbio, outros elementos para a definição do preço, como o volume de produção de petróleo, o custo de extração, o custo de refino e o movimento de demanda nacional de combustíveis, evitando que consumidores fiquem à mercê da instabilidade e falta de previsibilidade.
Hoje estamos exportando petróleo cru, importando derivados, temos capacidade produtiva ociosa, e quem defende essa estratégia afirma que isso vai gerar mais concorrência, mais mercado e novos investimentos. Quem acredita nisso?
A produção nacional nos últimos cinco anos cresceu 18% e chegou a 3,7 milhões de barris equivalentes por dia. Exporta cerca de 1 milhão de barris por dia. Os custos de produção têm caído cerca de 31% nas refinarias da Petrobrás – em razão dos ganhos de eficiência. A Petrobrás é responsável por 93% da produção de petróleo e gás e 99% na produção de derivados. Nesse cenário por que pagamos mais caro pelo combustível?
Como já apontado em estudos do Dieese, a Petrobras poderia recuar da política PPI e levar em consideração outros fatores, como a produção de petróleo e refino no país, custos para essas produções, câmbio, demanda por derivados. Também caberia a ANP e ao governo federal dar mais transparência e visibilidade, para que distribuidores e revendedores não capturem os ganhos. Usando esses princípios a empresa poderia repassar aos preços dos derivados os ganhos de produtividade que tem conquistado, pois está aumentando a produção de petróleo e reduzindo custos no refino.
O Brasil é produtor de petróleo e tem refinarias que atendem à quase totalidade de sua demanda interna. Ou seja, temos capacidade para explorar e refinar, podemos diminuir importações, reduzindo assim a dependência do país diante do mercado externo. Qual nação não deseja ter soberania energética?
Diante desse cenário, importante questão a ser respondida pelos candidatos nas próximas eleições: qual é a política de preços que pretende praticar se for eleito? De paridade com os preços internacionais, sujeita às flutuações do mercado externo, ou a calculada com base nos custos de produção e que garanta investimentos da Petrobras para abastecer o país?
Anelise Manganelli é economista e técnica do Dieese. Escreve mensalmente para o Extra Classe.
Política de preços da Petrobras colabora para descontrole da inflação - Extra Classe
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